Os Velhos
Em suma: somos os velhos,
cheios de cuspo e conselhos,
velhos que ninguém atura
a não ser a literatura.
E outros velhos. (Os novos
afirmam-se por maus modos
com os velhos). Senectude
é tempo não é virtude...
Decorativos? Talvez...
mas por dentro “era uma vez...”
*
Velhas atrozes, saídas
de tugúrios impossíveis,
disparam, raivoso, o dente
contra tudo e toda a gente.
Velhinhas de gargantilha
visitam o neto, a filha,
e levam bombons de creme
ou palitos “de la reine”.
A ler p’lo sistema Braille
ó meus senhores escutai!
um velho tira dos dedos
profecias e enredos.
Outros mijam, fazem esgares,
têm poses e vagares
bem merecidos. Nos jardins,
descansam, depois, os rins.
Aqueles outros (os coitados!)
imaginam-se poupados
pelo tempo, e às escondidas
partem p’ra novas sortidas...
Muito digno, o reformado
perora, e é respeitado
na leitaria: “A mulher
é em casa que se quer!”
Velhotes com mais olhinhos
que tu, fazem recadinhos,
pedem tabaco ao primeiro
e mostram pouco dinheiro...
E os que juntam capicuas
e fotos de mulheres nuas?
E os tontinhos, os gaiteiros,
que usam cravo e põem cheiros?
(Velhos a arrastar a asa
pago bem e vou a casa)
E a velha que se desleixa
e morre sem uma queixa?
E os que armam aos pardais
nessas hortas e quintais?
(Quem acerta co’os botões
deste velho? Venha a cidade
ajudá-lo a abotoar
que não faz nada de mais!)
Velhos, ó meus queridos
velhos,
saltem-me para os joelhos:
vamos brincar?
Alexandre O'Neil
Em suma: somos os velhos,
cheios de cuspo e conselhos,
velhos que ninguém atura
a não ser a literatura.
E outros velhos. (Os novos
afirmam-se por maus modos
com os velhos). Senectude
é tempo não é virtude...
Decorativos? Talvez...
mas por dentro “era uma vez...”
*
Velhas atrozes, saídas
de tugúrios impossíveis,
disparam, raivoso, o dente
contra tudo e toda a gente.
Velhinhas de gargantilha
visitam o neto, a filha,
e levam bombons de creme
ou palitos “de la reine”.
A ler p’lo sistema Braille
ó meus senhores escutai!
um velho tira dos dedos
profecias e enredos.
Outros mijam, fazem esgares,
têm poses e vagares
bem merecidos. Nos jardins,
descansam, depois, os rins.
Aqueles outros (os coitados!)
imaginam-se poupados
pelo tempo, e às escondidas
partem p’ra novas sortidas...
Muito digno, o reformado
perora, e é respeitado
na leitaria: “A mulher
é em casa que se quer!”
Velhotes com mais olhinhos
que tu, fazem recadinhos,
pedem tabaco ao primeiro
e mostram pouco dinheiro...
E os que juntam capicuas
e fotos de mulheres nuas?
E os tontinhos, os gaiteiros,
que usam cravo e põem cheiros?
(Velhos a arrastar a asa
pago bem e vou a casa)
E a velha que se desleixa
e morre sem uma queixa?
E os que armam aos pardais
nessas hortas e quintais?
(Quem acerta co’os botões
deste velho? Venha a cidade
ajudá-lo a abotoar
que não faz nada de mais!)
Velhos, ó meus queridos
velhos,
saltem-me para os joelhos:
vamos brincar?
Alexandre O'Neil